31 de agosto de 2008

FAZER ALCOFAS COLORIDAS - 3

Dos muitos artífices com quem tenho contactado ao longo de vários anos, são os cesteiros e esteireiros os que mais se têm extinguido e dado por terminada a tarefa. Queixam-se da dureza do trabalho e da falta de reconhecimento do esmero e rigor com que executam os cestos ou esteiras.
Recordo um lamento das mulheres de Castanheira (Cós), recolhido em 2000.
«O junco vem em molhos do Alentejo, depois junta-se em mãozinhas, corta-se, molha-se, mete-se no pacote e enxofra-se várias vezes para ele aclarar, porque vem mesmo preto. Depois escolhe-se à medida que a gente quer, escolhe-se, tira-se algum preto e depois é que se trabalha." Para o tingir, é num caldeiro com água a ferver. Tinge-se de vermelho, verde, roxo e amarelo. Tudo isto dá muito trabalho e, como dizem estas mulheres, não dá para a gente nova. Faz muitos calos nas mãos e deforma os ossos. Na realidade, se tivermos em conta os preços das tintas (onze, doze e dezasseis contos o quilo); as horas que leva a urdir e as horas que um cesto demora a tecer (cerca de duas), para ser vendido a oitocentos escudos, apercebemo-nos da justeza das lamentações destas mulheres.»
in PERDIGÃO, Teresa - Tesouros do Artesanato Português, Madeiras, Fibras vegetais , Materiais Afins, Volume I, Verbo, Fotos de Nuno Calvet, 2001, p.193.

ALCOFAS COLORIDAS e as deusas Íris e Ísis - 2




Estarão as cores destas alcofas relacionadas com a deusa grega Íris de que fala Mª Zulmira Marques, ou com a egípcia Ísis de que fala Moisés do Espírito Santo em Cinco Mil Anos de Cultura a Oeste?
Segundo esta autora, Santa Eufémia, padroeira de Cós (Alcobaça), terá vindo, com o advento do Cristianismo, substituir Íris:
"Como a deusa pagã estava conotada com o arco-íris e era considerada pelos gregos e Fenícios mensageira que tinha por missão transmitir aos mortais os bons augúrios, julga-se que, quando os fenícios aportaram a estas paragens, devem ter trazido esta imagem. E o "arco-íris" da deusa Íris/Eufémia não teria inspirado os tapetes de junco multicolores existentes nestas paragens?"
in MARQUES, Mª Zulmira Albuquerque Furtado - Por Terras dos Antigos Coutos de Alcobaça - História, Arte e Tradição, Alcobaça, 1994.
Foto de Teresa Perdigão

ALCOFAS COLORIDAS - 1

Um aspecto interessante das feiras, festivais ou mercados medievais é mostrar artefactos e artífices que o tempo e as novas necessidades vão empurrando para o beco do esquecimento. Eles representam técnicas e saberes que a experiência foi aperfeiçoando e que, muito provavelmente, contribuiram para a evolução do conhecimento.

Na Aljubarrota Medieval podia ver-se um tear onde se tecem as alcofas coloridas de Castanheira (Cós, Alcobaça).

Foto de Teresa Perdigão

24 de agosto de 2008

MOINHO de A-DOS-RUIVOS 3 - Engrenagens




Alfredo Almeida e Toneca são os engenhosos enpreendedores da reconstrução do moinho de A-dos-Ruivos.
Toneca sabia das artes da moagem e Alfredo era conhecedor das artes da carpintaria e marcenaria. Lado a lado, puseram em prática os saberes que conduziram à construção e instalação das engrenagens que, com a ajuda do vento, movem as mós.

19 de agosto de 2008

O MOINHO DE A-DOS-RUIVOS 2 - Paisagem



Paisagem de vinhas e pomares, vista da janela do moinho do Toneca, no mês de Junho.
Foto de Matilde do Couto

18 de agosto de 2008

MOINHO DE A-DOS-RUIVOS 1



Os moinhos da região Oeste, de que falava Júlio César Machado, nos finais do século XIX, desapareceram. Mesmo o do moleiro Toneca, não resistiu. Só depois de regressado da emigração é que ele, neto e filho de moleiros, se encheu de brio e pôs as velas a agitarem-se ao vento e as mós a moer.



O Senhor Toneca
Não vende farinha, dá!
Não tem postais para divulgar a imagem do moinho, deixa que tirem fotos e que as levem consigo.
Não recebe grafiticações, oferece generosamente o seu tempo.
Não fez cursos de formação, nem de turismo, nem de animador cultural, mas desempenha adequadamente o papel de formador e animador, perpetuando técnicas e saberes que, sem ele, se perderiam.
A porta está aberta a escolas ou a qualquer visitante que deseje ver e saber mais.
Para saber mais sobre A-dos-Ruivos, veja CARVALHAL ... E PERAS - Viagens por memórias e paisagens da autoria de Agneta Bjorkman e Teresa Perdigão
(Agradeço à fotógrafa Agneta Bjorkman a cedência da foto do Sr. Toneca)

15 de agosto de 2008

AUTO DE FLORIPES NA ILHA DO PRÍNCIPE


Hoje, como todos o anos neste dia, as ruas de Santo António do Príncipe transformam-se num imenso palco onde, desde o raiar do sol até noite escura, se representa O Auto de Floripes ou de S. Lourenço.
Lutam entre si turcos e cristãos protagonizados respectivmente por Ferrabrás, filho do Almirante Balão, chefe dos turcos, e pelo cristão Oliveiros .
Floripes é a princesa turca que trai o pai e casa com um cristão.
O dia termina em verdadeira euforia de danças e cantares que as mulheres da ilha entoam percorrendo, em correria, todas as ruas da localidade.

11 de agosto de 2008

Eficácia da água 2


Foi há uns 20 anos, na Ladeira do Pinheiro, junto à casa da chamada Santa da Ladeira ou Mãe Maria.
Uma crente lavava os olhos do filho na poça da água santa, quando alguém, talvez menos crente, passou:
Ele - Essa água está tão suja, minha Senhora!
Ela – Mas cura! Olhe – continua ela – o que nos salva é a fé, não é o pau da barca!
Ele – Como? Diga?
Ela – Ah! Não sabe!? Olhe, um homenzinho da minha terra que não podia ir à festa que se faz do outro lado da lagoa, pediu ao barqueiro que lhe trouxesse uma lasca da árvore do santuário, como toda a gente faz. É uma árvore benta que a gente guarda de ano para ano. O barqueiro, no regresso, viu que se tinha esquecido da encomenda e… não esteve com meias medidas! Toca de cortar um lasquita ao barquito e deu-a ao homem… Olhe, e o homem guardou-a, como se fosse da árvore, e diz que deu resultado. O que nos salva é a fé, não é o pau da barca, percebe?

8 de agosto de 2008

EFICÁCIA DA ÁGUA


"C'est parce que l'eau a une puissance intime qu'elle peut redonner à l'âme pécheresse la blancheur de la neige. Est lavé moralement celui qui est aspergé physiquement."
Gaston BACHELARD, L'eau et les Rêves - Essai sur l'imagination de la matière, librairie José Corti, Paris, 1964, p. 194
Foto de Jurgen Gruber (Croácia)

7 de agosto de 2008

SENHORA DAS NEVES - 2

DIz Frei Luis de Sousa (séc.XVII) sobre a capela de Nossa Senhora das Neves (Serra de Montejunto): "Na entrada da porta se acha huma pia aberta a picão na lagea, e chão natural da ermida, que juntamente he pia, e fonte, porque corre agoa, e dura a fama de ser milagrosa pera infirmidades"
(citado por Paulo Ferreira da Costa in Montejunto, imaginários e celebrações de uma serra, p. 110).
"... el agua, simbolo asociado frecuentemente con el fuego (...), condensa ideas de fertilidad, purificación y descontaminación. El agua, como elemento imprescindible en un tipo de sociedad agraria, preside el ciclo de fiestas de verano."
in Tiempo de Fiesta, Ensayos Antropologicos sobre las Festas en España, Colleccion Alatar, 1982, p.153.

SENHORA DAS NEVES - 1




É a 5 de Agosto que Nossa Senhora das Neves é venerada.



A Serra de Montejunto recebe a maior romaria das redondezas. "mais do que uma festa local ou concelhia (é também a festa de maior importância do concelho do Cadaval) ela parece sempre ter sido, como Santa Quitéria de Meca, uma romaria de alcance regional, a ela acorrendo actualmente, mesmo se a celebração ocorre em dia de semana, várias centenas de romeiros (...) de todos os arralbaldes da Serra, não só do Cadaval, mas também dos concelhos de Alenquer, Lourinhã, Bombarral, Torres Vedras, etc.(...)". in COSTA, Paulo Ferreira da - MONTEJUNTO, imaginários e celebrações de uma serra, Cadaval,LeaderOeste, 1999, pp. 107-108.




(imagem retirada da Net)

5 de agosto de 2008

AUTO DE FLORÍPES - NEVES - VIANA DO CASTELO

"Vocês lutem, carago! Vós sabeis que ides ganhar, mas lutai!" Foram estas as últimas palavras que o grupo dos cristãos ouviu, quando, em 1995, assisti, pela primeira vez, ao Auto de Florípes.

É graças a Floripes que a vitória está garantida! Atraiçoa o pai, rei turco, e apaixona-se por um cristão, levando todo o exército turco à conversão, com excepção do seu pai.

É assim todos os anos, na aldeia das Neves.



http://www.youtube.com/watch?v=IvO9tLjCjBQ

S. GIÃO - NAZARÉ 3




O espaço interior da igreja visigótica de S. Gião, um dos raros exemplos de igrejas paleo-cristãs, existentes em Portugal,estava organizado de forma a que o clero, disposto no coro, estava separado do povo. Aqui, o que há de original, é o facto desta separação se fazer através de uma parede com colunas e não por uma cancela, como era habitual. Diz o estudioso alemão Helmut Schlunk a este respeito que S. Gião "ocupa uma situação singular na Arquitectura da Península Ibérica". Diz ainda Saavedra Machado que "esta foi a primeira igeja, a nível mundial, a seguir a liturgia ditada pelos concílios de Braga (561) e de Toledo (663) que obrigava aà separação entre o clero e o povo".

S. GIÃO - NAZARÉ 2


Aguardamos há anos que as promessas se cumpram!
Quando as obras de restauro estiverem concluídas, o público visitará "uma igreja com mais de mil anos preservada na sua pureza, com uma luz ténue e sem embelezamentos porque não se pretende cortar a leitura daquilo que era um templo visigótico", disse Flávio Lopes.
A informação explicativa sobre como seria o monumento composto por uma nave central e pelo iconostasis (três arcos que dividem o povo do sagrado) constará num edifício anexo (uma construção recente que existia aquando da compra do monumento) que o IPPAR optou por não demolir. Painéis explicativos vão mostrar o desenho completo do templo descoberto por arqueólogos que conseguiram encontrar as suas fundações.

In http://algarvivo.com/arqueo/visigotico/ermida-nazare.html

S. GIÃO - NAZARÉ 1







A capela de S. Gião bordeja com o mar, entre S. Martinho do Porto e Nazaré. Há milénios, este local foi templo em honra de Neptuno e dos demais deuses do mar, segundo relata lápide aí encontrada.
Tornou-se templo cristão (séc.V-VI) e S. Julião passou a ser aí cultuado. Com o passar do tempo, com o desaparecimento dos monges agostinhos que acabaram por morrer de lepra, e com o florescimento de outros cultos, nomeadamente o de Nossa Senhora da Nazaré, o templo foi ficando ao abandono.
Em 1978, altamente degradado, foi classificado como monumento nacional.
Dez anos depois, José Manuel Fernandes escrevia no Expresso de 10 de Dezembro: “Lá dentro encontramos um depósito de tomates apodrecidos, alfaias agrícolas e trastes velhos e inúteis. Só com dificuldade acreditamos estar num imóvel classificado como monumento nacional. Mas estamos”.
Em 1994, escrevia Carla Tomás, no Público Magazine, a propósito do cenário com que se deparou, no interior: ”Estrume, palha, papéis imundos, sapatilhas velhas, lixo e mais lixo espalha-se pelo chão de terra batida.”
Agora é uma caixa enorme, em alumínio, que se destaca no sopé da Serra da Pescaria, com a Nazaré ao fundo e o sussurrar do mar, ali tão perto!!!!
O empacotamento foi feito pelo IPPAR.
Christo teria feito, pelo menos uma obra de arte visitável e … quem sabe? Lucrativa!