29 de junho de 2010

Validade dos Provérbios

Dentro de anos, os provérbios serão um bom alfobre para o estudo do tempo e da agricultura do século XX:
Pelo S. Pedro vai ver o teu olivedo. Se vires uma (azeitona) conta um cento.
(Alvito – Beira Baixa)

28 de junho de 2010

O Sol, São João e o Galo

Rebuscando nos muitos rituais que se fazem no país, aquando das festas de São João, encontram-se vestígios de símbolos que nos remetem para o culto ao sol.
Monforte da Beira é disso um exemplo. No final do dia, fazem-se as corridas de cavalos, cujos vencedores recebem um galo.
Ora, o galo é um símbolo solar. Encontramo-lo em Monforte, no solstício de Verão, e em Dezembro, no solstício de Inverno - na missa do galo! Já
aqui falámos dele.
Jaime Dias, na Etnografia da Beira descrevendo o S. João de Monforte da Beira (Vol. III, pg. 112-120), diz a respeito das corridas que se fazem na Devesa: "Posto um galo na meta e os cavaleiros, dois a dois, a certa distância, dado o sinal de partida, estes correm o mais que podem. Ganha o galo, o que chegar primeiro. As corridas duram enquanto há galos e estes, depois de disputados, são oferecidos: pelos solteiros, à noivas; pelos casados, às esposas; e, pelo vencedores que não têm noiva nem são casados, à esposa do alferes."

27 de junho de 2010

O S. JOÃO DE MONFORTE DA BEIRA

S. João no coração, mas em casa não. É a opinião de uma mulher que participava na festa. A sua e a de muitos mais monfortenses. A despesa é muita e na trabalheira nem se fala. Mas outros, muitos também, sentem uma enorme felicidade por poderem “dar” o S. João, como resultado de uma promessa.

No dia 23 de Junho, por volta das 16 horas, a bandeira de S. João vem para a janela da casa do “alferes” que é quem nesse ano “dá” o S. João. A bandeira, recebeu-a do “alferes” do ano anterior e guardou-a durante um ano, em sua casa.

Dão-se vivas ao S. João, ao povo de Monforte, aos padrinhos e ao alferes. Toda a gente participa. Todos batem palmas e uma dezena de mulheres toca adufes e entoa quadras ao S. João. Uma concertina acompanha-as e o resto da população também canta o refrão com elas.

Com o “S. João à janela”, dá-se início a uma festa que durará 24 horas. Tendo por símbolo a bandeira, esta festa une toda a comunidade na partilha de bens e alimentos.

O festeiro tem um grupo de familiares e amigos a ajudar na tarefa da distribuição de comida e bebida a todos. Dá vinho e bolos aos que vêm dar vivas ao S. João e dá com gosto. Sabe-se, no entanto, que toda a gente da aldeia contribuiu para que a festa seja em grande, dando mantimentos e dinheiro. “Dá-se conforme a afeição que a gente tem pelo alferes e pela família”, garantindo, assim, o sucesso da festa no que diz respeito à partilha.

Por volta das 9 da noite desse mesmo dia 23, o povo volta a aglomerar-se junto à casa do “alferes” onde está a bandeira.

Vêm em burros, cavalos e éguas. Dezenas de burros e dezenas de cavalos e éguas, fazem mais de uma centena de animais que, em grande desordem, aguardam, em frente à janela do Santo.

A janela está bonita e iluminada. Dão-se os últimos retoques nos cavalos que devem estar enfeitados e coloridos.

Em Monforte tanto adultos como crianças montam cavalos e burros com perícia! Há grande algazarra! Os animais começam a impacientar-se e o vinho vai fazendo efeito nos que os montam. Há atropelos, correrias e exibição de artes equestres salpicadas por maliciosas destrezas.

Mas basta alguém começar a brandir a bandeira à janela para que os ânimos se acalmem. Uma rapariga rosada e forte agita-a fortemente e grita três vezes “Viva o S. João”, “Viva o Povo de Monforte”, “Viva o Alferes!” e “Viva a Bela Sociedade”. O Povo repete energicamente os vivas. E os cavalos agitam-se.

O alferes monta o seu cavalo e ostenta a bandeira. Dos lados perfilam-se os padrinhos; os que tiveram o privilégio de serem distinguidos pelo alferes, como seus amigos ou familiares mais íntimos, para ocuparem aqueles lugares no cortejo.

Às 22 horas todos estão a postos. Repetem-se os habituais “Vivas” e começa a cavalgada! A galope percorrem as ruas de Monforte. A galope até que o inesperado e a surpresa os obrigue a estancar frente a enormes fogueiras que se acendem pelas ruas. Assim “agarra-se” o S. João! Obrigam-se os cavalos a saltar ou a evitar a fogueira.

É um espectáculo feérico, entusiasmante e empolgante. Atrás dos cavalos correm os miúdos. À frente dos cavalos escapam-se os que acendem as fogueiras inesperadamente com rosmaninho, caruma e arbustos secos. No ar sobem as faúlhas e um cheiro a fumo perfumado. A aldeia enche-se de vida na noite iluminada pelas chamas das fogueiras.

Já tarde juntam-se, de novo, ao pé da casa do “alferes”. Nova distribuição de vinho e bolos dá mais energia a cavalos e cavaleiros. Começa o arraial até altas horas e continua o convívio.

No dia seguinte, dia de S. João, pelas 9 da manhã perfilam-se, de novo, cavalos e cavaleiros para, juntamente com o “alferes”, percorrerem as ruas, agora à luz do dia. As pessoas recebem o cortejo à porta, dando esmolas e atando fitas à bandeira de S. João. Estas dádivas são promessas, mas são também uma forma de ajudar à festa.

Depois da missa do meio-dia, o alferes dá uma farta refeição a amigos e familiares. Serve-se de tudo e com muita fartura. Fica caro fazer esta festa, dizem, mas ninguém perde com ela porque o povo dá tantos alimentos e dinheiro, que o “alferes” ainda fica a ganhar. “O povo dá conforme a afeição que tem por quem faz a festa”. Assim, ajuda-se o amigo a fazer boa figura e a ser bem visto.

À tarde a festa atinge o auge com uma empolgante e participada corrida de cavalos. Habitantes e forasteiros, a pé, de carro ou a cavalo, dirigem-se para a Devesa, um enorme terreiro que, nos arrabaldes, serve de pista à corrida.

Os mirones acotovelam-se e incitam os mais afoitos a iniciarem as corridas que se fazem em pares de dois, a cavalo, de burro e até, a pé. Cada um procura um adversário que não lhe custe muito a vencer, mas também ninguém quer passar pela vergonha de vencer, sem dificuldade. Outros procuram, propositadamente, o adversário com querem ajustar contas e não se poupam a grandes esforços para o vencer.

A população aplaude, faz apostas e elege os maiores da corrida. Além deste reconhecimento público, cada vencedor ganha um galo por cada corrida vencida. Quantos mais galos trazem, mais valentes são!

A festa acaba quando o “alferes” entrega a bandeira àquele que irá “dar o S. João” no ano seguinte. Dão-se vivas ao novo alferes e agradece-se ao alferes velho!
Monforte da Beira, 1997

26 de junho de 2010

Banho Santo, pelo São João

O BANHO SANTO

Em 1925, a Gazeta, jornal das Caldas da Rainha, fazia referência ao Banho Santo que as pessoas tinham por hábito tomar, nas suas termas, no dia 24 de Junho. Era um banho muito concorrido que, segundo a crença, valia por sete!


“Quem nos pode valer?
... Só o milagroso S. João! ... O santo querido das môças e móços de Portugal ... E ele aí esteve espalhando os benesses do Ceu sobre os dois ou três mil peregrinos, assim chamados, que mais uma vez vieram procurar no tradicional banho a cura ou as melhoras de seus achaques.
Pois quem póde perder o Banho Santo! se êle é uma cura de águas; é a cura correspondente aos 20 classicos banhos prescriptos pela sciencia! ... Mas a sciencia ante a crênça tradicional, nada vale.
Vamos ao Banho Santo ... O Joãosinho de mãos dadas com a Santa Rainha Leonôr, vale bem mais do que todas as sciencias da terra! ...
E foi assim. E foi por isso que o nosso Hospital se encheu de viandantes, abrindo as suas portas à pobreza, a todos aqueles que teem religião e Fé.
3.200 banhos! Já é. Que Deus os faça voltar ao Banho Santo e que as Caldas se lembrem de promover para esse tempo alguns atrativos, pois com isso ...
revive tradições, desfolha recordações dum passado saudoso ... e desfructará o benefício material.”

Hoje ainda há uns resistentes que vêm ao banho santo. No dia 24 de Junho, não faltam, embora não voltem mais ao longo do ano. O Hospital Termal mantém a tradição da sua gratuitidade.

25 de junho de 2010

Jano, de Janeiro a Junho

Em Janeiro é Jano que nos abre a porta do ano, olhando com uma face para um lado e com a outra para o outro. Acreditam muitos que ele olha para o passado como algo de irremediável e para a frente, com bom augúrio, dando passagem a tudo o que de bom virá com o novo ano. Foi, a partir do dom da “dupla ciência”, atribuída por Saturno, segundo a mitologia romana, que os homens foram construindo este deus, atribuindo-lhe duas faces e concedendo-lhe o poder de superintender e vigiar todos os lugares de passagem, pois que é só no limiar que se têm os dois lados – um, já passado; o outro, a passar.
Com o tempo e com imaginação ele tornou-se o guardião do ano novo que lhe deve, a ele, o nome do seu primeiro mês. E associou-se também a Junho, a partir da Idade Média, quando se associou Jano a João, a S. João Baptista, filho de Isabel e anunciador da vinda de Jesus à Terra. Construiu-se uma alegoria cristã, segundo a qual João se deixaria ofuscar pela luz do seu primo, Jesus. Ele, sim, a Luz da Vida. Ambos eram comparados ao sol, mas um brilharia mais forte do que o outro. E assim, João, a partir de hoje, até ao solstício de Inverno, irá lentamente perder a sua luz, para a dar a Jesus. E, a partir de Dezembro, Jesus será o Rei. O Sol. A Luz que iluminará os homens de boa vontade.
Feita a comparação e juntando os símbolos do passado pagão aos do cristianismo, desfez-se o sentido da festa solsticial e fez-se a festa cristã.

24 de junho de 2010

Flambe feu ...


Flambe feu;
Je te donnerai un œuf;
flambe gros,
je t’en donnerai neuf,
flambe petit,
Je t’en donnerai dix

Canção francesa da região do Dauphiné
In Philippe Walter - Mythologie Chrétienne, p.193

Da celebrações pré-cristãs, pelo solstício de Verão, restam-nos as fogueiras de São João, feitas de ramos bem cheirosos, os manjericos, os alhos porros, as alcachofras e a erva-de-São João.
As fogueiras fazem-se noutras épocas do ano tão marcantes como o solstício de Verão. Subsistem no Natal de Trás-os-Montes. Disfarçam-se em "queimas de Judas", "queimas dos compadres" e círios pascais, pelo Carnaval ou pela Páscoa. Escondem-se dentro de abóboras, a 1 de Novembro, ou noutras fantasias, mas todas elas manifestações, mais ou menos distintas, de um mesmo rito primordial - o culto ao sol.


Hoje, o 24 de Junho, festeja-se de variadíssimas formas, pelo país inteiro. Desde o mediatizado S. João do Porto, passando por alguns dos mais significativos, como o de Monforte da Beira e a Bugiada do Sobrado, e acabando nos festejos onde persiste quase unica e exclusivamente o convívio, à volta de uma fogueira e de uma sardinhada.
Na Serra dos Mangues (S. Martinho do Porto, Alcobaça), uma pequena associação, convocou os vizinhos para celebrar São João. Sardinhas, febras, pão e vinho, associados ao convívio, deram vida à festa. No ar espalhou-se o fumo com cheiro a rosmaninho e alecrim.
A Serra dos Mangues e toda aquela zona costeira está cada vez mais povoada de estrangeiros, alemães, ingleses e holandeses, mas poucos responderam ao convite.

23 de junho de 2010

Véspera de S. João

Era hoje que um rancho de raparigas ia ao pinhal apanhar as flores que mais tempos se conservassem viçosas. Roxas, brancas e amarelas.
As outras iam aos jardins das vizinhas, recolhendo, em braçados, rosas, alecrim, alfazema e outras verduras que dessem cor ao arco que à noite iriam enfeitar. O arco era uma armação em madeira que ficavam sempre, de ano para ano, em casa de quem desse mais jeito e que, no ano seguinte, seria condignamente reparado. Chamavam-lhe arco, mas tinha mais a forma de rectângulo incompleto, com a parte de cima a dar o jeito de coroa e na parte de baixo, dois grandes pés que o sustentavam.
À tardinha, a tarefa dos rapazes era pregar daqui, pregar dacolá, segurar mais ali, levantar mais acolá. A pouco e pouco, mas com rapidez, punham o arco num brinquinho, pronto para as raparigas armarem. Aos miúdos mais pequenos não escapava este frenesim que invadia o lugar. Às mães também não. Vigilantes, aproveitavam o momento para irem à fonte de cântaro deitado sobre a rodilha que lhes assentava sobre a cabeça. De regresso, traziam-no em equilibro, direitinho, mesmo que tivessem de se voltar para trás, amiúde, soltando recomendações às raparigas solteiras e, talvez virgens.
Armado o arco, ele era levantado, junto às bicas, e preso à parede caiada de branco. Era um gosto fazer da mão uma concha, beber a água fresca que corria ininterruptamente, olhando o arco, como se fosse uma porta florida para deixar passar os sonhos.
A ceia fazia-se a correr. E era logo a seguir, por volta das dez da noite, que as raparigas, graças ao S. João, tinham permissão para se juntarem na fonte e fazerem uma fogueira no meio da estrada, que os mais afoitos saltariam. Elas não. Ficavam de lado, rindo, batendo palmas perante a perícia deles, desdenhando dos mais exibicionistas e acirrando os mais tímidos.
Mas a coisa mudava de figura quando chegava o som da concertina do Zé Danita e os olhares matreiros dos rapazes se cruzavam com os delas, ora aquiescentes ora de indiferença ou até de desprezo, quando pretendiam galar galo que cantasse mais alto.
Dançavam em roda, à volta da fogueira que, se ia extinguindo e, lentamente, se reduzia a brasido. Quanto menos luz ela emanava, mais os corpos, agora já a dois, se aproximavam, suados e desejosos de transir, a sós, os efeitos do desejo, já que mais, ali não lhes era permitido.

22 de junho de 2010

Viagem à Berlenga

Rui Veloso apadrinha candidatura das Berlengas a Maravilha Natural

É o título de uma notícia da Gazeta das Caldas de 18 de Junho.
A minha atenção fixa-se nos nomes da comitiva que irá hoje mesmo à Berlenga, dar voz à candidatura da ilha a “7 Maravilhas Naturais de Portugal”: Rui Veloso, Carlos Magno (jornalista e comentador político), Ida Guilherme (artesã), João Lagos (empresário), Jorge Jesus (treinador de futebol), Miguel Arrobas(nadador), Pedro Salgado (biólogo e ilustrador científico) e Sónia Balacó (modelo e actriz). Diz a notícia que o que os une é serem todos amigos das Berlengas e estarem, pelo seu passado, mais ou menos recente, ligados ao arquipélago.
Fixo-me no nome e na figura de Ida Guilherme, rendeira, pintora e poeta que passou grande parte da sua vida nas Berlengas, onde os seus pais passavam todos os verões. Foi lá, na ilha, que aprendeu o som dos bilros, que desenhou palavras no vento, enquanto vagueava, remando, por entre as brechas que o mar abria nas rochas e descobria a beleza das grutas. Foi lá que amou o tempo do mar e das gaivotas. Foi de lá que trouxe um acerado entusiasmo pela defesa do seu património.
Por isso tem publicado livros, a suas expensas, sobre Peniche, sobre as ilhas, as rendas e as paisagens.
E recentemente iniciou um blog intitulado Rendas de Bilros de Peniche .
Por isso, gostei muito de ver o seu nome associado a esta viagem.

21 de junho de 2010

Recomeçar

Com a chegada do Verão, agora mesmo, às 12h18m, retomo o blog.